Na íntegra - Jornal O Tempo: Sem paletó e gravata, com as mangas da camisa dobradas e óculos de sol.
Assim o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), vistoriava a
obra da avenida Antônio Carlos, em frente do Hospital Belo Horizonte,
por volta das 12h30 de ontem. E foi lá que ele recebeu a reportagem de O TEMPO para falar sobre a reviravolta que o processo eleitoral teve na capital mineira.
Questionado
se ele sempre visitava pessoalmente as obras no horário de almoço,
respondeu que é preciso acompanhar de perto, mas explica que recebeu
reclamações sobre dificuldades para travessia de pedestres e, por isso,
fez questão de verificar pessoalmente. Vistoriada a obra, Lacerda deu
algumas ordens para a pequena equipe que o acompanhava e decidiu
continuar a entrevista dentro do carro: "a gente vai falando no caminho
de volta para a prefeitura".
A primeira pergunta é a mais óbvia:
prefeito, como o senhor explica essa reviravolta? "Vou te contar desde o
começo. É uma história que eu vou escrever mais tarde, mas decidi falar
para O TEMPO". De maneira muito calma, ele começa a
explicar a aliança feita em 2008. Diz que naquele momento, as lideranças
de vários partidos buscavam alternativas de recomposição partidária.
Aécio Neves e Fernando Pimentel queriam apoiar um candidato que
aprofundasse a relação entre a prefeitura e o governo estadual. "O
objetivo era dar um caráter mais técnico e profissional", afirma. Mas
conta que, logo no começo do governo, teve problemas com o seu
vice-prefeito, Roberto Carvalho (PT). "Ele tinha uma estrutura com cerca
de 40 pessoas. Falei para ele aproveitar isso para trabalhar a questão
da juventude, da região metropolitana e dos empregos". Garante, porém,
que nunca teve uma resposta sobre essas demandas.
Apesar disso, o
prefeito afirma que a equipe do PT que estava na prefeitura até agora,
no rompimento da aliança, era muito competente e dedicada.
Voltando
a falar sobre Roberto Carvalho, Lacerda explica que seu vice já estava
trabalhando para ser candidato desde 2008 e sem preocupação de esconder o
seu propósito. Mas, para o prefeito, a tensão se agravou após a eleição
de 2010, quando houve uma grande polarização entre PT e PSDB. "Eu
apoiei Dilma", destacou. Lembra que ajudou a criar um comitê em Belo
Horizonte para ali mobilizar os prefeitos. E repete de forma enfática:
"Eu estava com Dilma no primeiro e segundo turnos. No começo, os
petistas nem queriam ir para lá, alegando que eu estava fazendo o
Dilmasia. Mas no segundo turno, o comitê funcionou muito bem. Eu apoiei
Dilma, e Pimentel para o Senado".
Lacerda avalia que, naquele
momento, a polarização foi tão grande que ele reconhecia que seria muito
difícil reeditar a aliança. Mas, segundo o prefeito, com o tempo, os
ânimos se acalmaram e, em meados de 2011, ele começou a conversar sobre a
aliança com lideranças do PT e PSDB.
A ideia era repetir a
coligação e manter a vaga de vice com o PT. "Conversei com o senador
Aécio Neves, falei para ele que o vice tinha que ser do PT, e ele
concordou, avaliou que era possível vender essa tese para a turma dele".
Diz que conversou também com o ex-presidente Lula e o presidente do PT
nacional, Rui Falcão, que também concordaram com a reedição da aliança.
Segundo o prefeito, naquele momento, os próprios petistas reconheciam
que Roberto Carvalho não tinha estatura para ser o prefeito de Belo
Horizonte e até evitavam o vice-prefeito, que continuava articulando a
sua candidatura.
A partir daí começou a discussão sobre o nome
para a vaga de vice. "O PT quis colocar o Roberto de vice. Mas isso não
dava para aceitar. Mas o Roberto é o presidente do PT municipal, foi uma
espécie de prêmio de consolação que ele ganhou. E ele deixou o PT
municipal do jeito dele. Deixaram ele dominar a estrutura partidária",
fala de forma enfática.
De acordo com o prefeito, na negociação
com Rui Falcão, em dezembro de 2011, foi pedido tempo de TV na campanha
para o candidato a vice do PT pedir voto para os vereadores. Ele explica
que a carta assinada pelo presidente do PSB, Walfrido Mares Guia, fala
apenas em negociar com todos os partidos sob condições a serem
acertadas. "Pedimos a lista dos nomes dos candidatos para tentar fazer
uma composição, mas a lista não nos foi entregue. Falamos que os
vereadores tinham que também fazer campanha para o prefeito, mas também
não concordaram".
O prefeito diz que desde maio tenta um
entendimento entre as partes e, para isso, procurou Aécio e o
ex-ministro Ciro Gomes. "O PT entendeu que o senador Aécio queria o
rompimento da aliança. Mas não foi isso. O senador Aécio Neves apenas
disse a mim e ao Ciro que não era possível o PSDB aceitar a proporcional
com o PT, já que os petistas tinham a vaga de vice".
Lacerda
conta ainda que em abril deste ano ficou com a "faca no pescoço". "Eu já
falei isso. Eu me senti como aquele filho de pais que se separam e
ficam, cada um, puxando o menino para o seu lado", compara em tom de
reclamação.
O prefeito aproveita para reconhecer um erro. "Eu
não aceitei o rompimento em abril. Foi o meu erro. Talvez tivesse sido
melhor não tentar o entendimento até o último momento. Fiz isso pensando
na cidade. Pedi ajuda para as principais lideranças nacionais do PT, do
PSB e do PSDB".
Questionado se ele se sentia usado pelo PT e
pelo ministro Fernando Pimentel, Lacerda conta uma historinha. "Durante
essas negociações, meu amigo Fernando Pimentel me disse que eu tinha que
entender que eu era um peão no tabuleiro do jogo. Um peão. Eu ainda
brinquei: nem um cavalo?", conta, com um sorriso sem graça.
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